O biodiesel já não é mais a única alternativa renovável ao óleo diesel disponível em nível global. Embora ainda tenha participação minoritária, o óleo vegetal hidrotratado (HVO) tem ganhado tração e vem atraindo investimentos de grandes players, especialmente no mercado da União Europeia (UE). A produção nos países do bloco europeu beirou 2,8 bilhões de litros no ano passado.
Até recentemente, contudo, América Latina vinha passando ao largo desta onda. A região só começou a correr atrás do terreno perdido no final do mês de fevereiro, quando a ECB Group anunciou a intenção de investir US$ 800 milhões – cerca de R$ 3,35 bilhões – na construção de uma biorrefinaria capaz de fabricar até 20 mil barris – 3,18 milhões de litros – por dia de HVO e bioquerosene de aviação no Paraguai.
O projeto é liderado por um velho conhecido da indústria brasileira de biodiesel: empresário Erasmo Carlos Battistella. Erasmo é fundador e controlador do Grupo BSBios – o maior fabricante de biodiesel do pais com 545,8 milhões de litros fabricos no ano passado – e presidente do conselho da Associação dos Produtores de Biocombustíveis do Brasil (Aprobio).
Além disso, ANP está se preparando para regulamentar o uso de outras alternativas renováveis ao diesel de petróleo no mercado brasileiro.
O HVO tem ao menos uma vantagem em relação ao biodiesel. Como ele é quimicamente mais parecido com o diesel de petróleo, pode ser usado em qualquer proporção – até mesmo puro – em motores se qualquer modificação adicional. O mesmo não acontece com o biodiesel.
Cada um no seu quadrado
Para Erasmo, o HVO e o biodiesel não estão necessariamente em rota de colisão. “O biodiesel é um patrimônio que nós temos aqui no Brasil e temos uma rampa grande pela frente”, diz ao se referir à caminhada rumo à adoção do B15 em 2023. No entanto, o empresário cobra mais ambição. “Temos que pensar maior e começar a falar em exportar biodiesel. O Brasil tomou algumas decisões equivocadas e não somos competitivos na exportação”, reclama.
Vale lembrar que a BSBIOS foi a primeiro fabricante brasileira a exportar volumes comerciais de biodiesel. Em junho de 2013, a empresa embarcou 22 toneladas rumo à Europa. A participação do Brasil no mercado internacional, no entanto, não durou. As usinas brasileiras estão sem embarcar quantidades comercialmente significativas desde dezembro de 2015. O maior nó, segundo Erasmo, está na área tributária. “Temos que fazer equalizações tributárias para podermos ter competitividade no mercado externo”, recomenda acrescentando que o Renovabio pode ajudar nesse aspecto.
Para Erasmo participação do HVO no mercado brasileiro de combustíveis precisa ser desenvolvida em paralelo ao biodiesel. “Temos que desenvolver o mercado, mas mantendo o nicho do biodiesel”, diz defendendo a adição dos dois biocombustíveis no diesel consumido no país. “A gente poderia ter o B15 e H5”, afirma se referindo a uma mistura que teria 80% de diesel convencional, 15% de biodiesel e 5% de HVO. O horizonte, no entanto, é que o HVO acabe superando o biodiesel. “O B20/H80 seria uma mistura ideal para reduzir as emissões de CO2 e poluentes em grandes cidades como São Paulo”, completa.
Para o Brasil, ele defende, o aumento do uso de biocombustíveis seria uma solução potencialmente mais vantajosa até mesmo do que a eletrificação das frotas. “Embora o HVO seja mais caro [do que o diesel e o biodiesel], a gente poderia aproveitar todo capex que já está aí: os mesmos postos, os mesmos caminhões e ônibus. Seria um ganho muito grande na agilidade”, avalia mesmo reconhecendo que, hoje, não há como saber para onde o mercado global vai caminhar. “Tudo são apostas, não temos como dizer onde vamos estar dentro de 20 ou 30 anos. Mas sabemos que precisamos de um padrão de consumo mais sustentável”, segue.
BioQAV
O HVO tem outra particularidade. Da mesma usina em que sai o diesel renovável também sai um tipo que bioquerosene que pode ser um substituto para os combustíveis de aviação de origem fóssil chamado querosene parafínico sintético (SPK, na sigla em inglês). “SE a gente introduzir o HVO, teremos também bioquerosene”, defende.
Para destravar os investimentos nessas novas tecnologias, no entanto, Erasmo diz que falta um marco regulatório claro para esses outros biocombustíveis. “Ninguém vai fazer investimentos de grande monta se não tivermos um marco para utilização ou se não formos competitivos na exportação”, diz.
Embora a plantas para a produção de HVO sejam mais caras e, portanto, demandem um nível maior de investimento, Erasmo ressalta que a tecnologia é uma oportunidade de desenvolver uma petroquímica verde. “É um upgrade do que estamos fazendo hoje”, opina.
Opeb
Para fortalecer a posição do Brasil no mercado global de biocombustíveis, Erasmo defende que o país deveria liderar a criação de um grupo internacional inspirado na experiência da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep).
“Temos que liderar a formação da Organização dos Países Exportadores de Biocombustíveis (Opeb). O Brasil tem um potencial gigante, mas, se olharmos para a América Latina, ficamos ainda maiores para criar um grande bloco de biocombustíveis”, defende. “Com um bloco atuante, teríamos mais uma agenda estratégica mais forte e um desenvolvimento econômico maior, diferente de ter cada um trabalhando sozinho”, prossegue.
Esta seria, inclusive, uma agenda de segurança e soberania nacional uma vez que, sem o biodiesel, o Brasil estaria importando uma quantidade ainda maior de diesel fóssil. Além disso, os biocombustíveis são uma ferramenta importante para alavanca o desenvolvimento econômico no interior do país. “O petróleo é importante mas desenvolve a costa, [os biocombustíveis] ajudam a viabilizar a nossa vocação de produzir alimento e energia”, afirma acrescentando que, sem o biodiesel, a indústria nacional de esmagamento estaria sem saber o que fazer com todo o óleo de soja que produz.
Fonte: Fábio Rodrigues – BiodieselBR.com
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